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A psicóloga que tem uma caixa de primeiros socorros para as emoções

Ela tinha um sonho: trabalhar com os Médicos sem Fronteiras. Queria ser psicóloga e implementar planos de saúde mental nos quatro cantos do mundo. Mas achava que não ia conseguir porque não era médica. Enganou-se. Aos 33 anos, Maria Palha conta com intervenções no Zimbabwe, Brasil, Líbia, Turquia, Caxemira, Síria, Sudão do Sul, Camboja. Com a experiência que adquiriu nas missões humanitárias e nas consultas em Portugal lançou recentemente Uma Caixa de Primeiros Socorros das Emoções.

Depois de se licenciar em Psicologia, no ISPA, em 2005, Maria recusou uma oferta de um emprego estável em Portugal para viajar para Moçambique, onde trabalhou no Hospital Central de Maputo. Ia por três meses, mas ficou dois anos. Nesse período, concorreu aos Médicos sem Fronteiras e concretizou o seu sonho.

A aventura começou no Zimbabwe, onde trabalhou com pacientes com sida. Seguiu para as cheias no Brasil. Esteve em contextos de guerra na Líbia (2011), quando caiu o Kadhafi, na Síria (2013), na Ucrânia (2014) e no Sudão do Sul (2014). E nos pós-guerra em Caxemira e no Camboja.

Em Uma Caixa de Primeiros Socorros das Emoções, Maria quer ensinar os portugueses a gerirem as suas emoções. "Quis criar uma ferramenta que funcionasse como uma medida preventiva." Para isso, conta ao DN, compilou "histórias do mundo inteiro", às quais juntou "técnicas e dicas de autoajuda", que permitem ao leitor compreender as suas emoções e "dar uma resposta adequada". Tudo para "evitar estados de maior sofrimento".

O livro começa com um dos episódios que mais marcaram a psicóloga durante as missões. Na Síria, foi procurada pelo líder de um grupo armado. "Disse-me que as pessoas andavam todas a falar de emoções, que ele não sabia lidar com os combatentes e que chorava todos os dias quando pensava que tinha de enviar o filho para levantar os corpos na linha da frente", recordou. Esta história mostrou-lhe "o quanto somos preconceituosos" e que o melhor "é agir sem julgamentos".

Salta-lhe à memória uma mulher, no Sudão do Sul, que estava há nove meses num campo de refugiados com os filhos subnutridos e com malária. Maria demorou a chegar até ela. Conquistou-a oferecendo-lhe sabonetes. Quando voltou lá, a mulher deu-lhe o braço a cheirar e convidou-a para ser madrinha de um dos filhos. "O marido tinha morrido e ela estava com uma depressão muito grande, estava mal. Se tivesse tido a informação necessária, não teria chegado àquele ponto", lamenta. São essas ferramentas que a psicóloga quer partilhar com os portugueses.

Nunca sentiu medo? "Somos humanos, mas eu tenho o privilégio de ter muita informação, o que me permitiu integrar novas formas de ação, perceber quando tinha de tirar férias." E como se implementam planos de saúde mental num campo de refugiados? Numa primeira fase, explica, ajudando "os cuidadores a criar o seu kit SOS das emoções". Depois, explicar às pessoas "onde estão, os recursos que têm e as suas responsabilidades". A nível psicológico, começa com intervenções em grupo e só depois passa para as sessões mais individuais.

Além de sair uma vez por ano em missão com os Médicos sem Fronteiras, Maria Palha dá consultas privadas e é consultora de programas de impacto social.


Diário de Notícias - Portugal - 10/02/16

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